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Capítulo 11

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     Ellen Marinalva (a filha do vigia noturno) veio falar comigo. Começou usando um tom firme, quase agressivo, depois foi abrandando. Felício disse que não podia ficar mais com ela porque gostava de mim. Respondi logo que eu não tinha nada com isso e não o autorizava a fazer comentários e divagações sobre os meus sentimentos. E que ela insinuou que, se ele gostava de mim, era porque eu, direta ou indiretamente, dava motivos para isso. Foi uma conversa tão chata, tão chata, que nem vale a pena entrar em detalhes. Mas mexeu, e muito, comigo.

     Fui até a beira do rio. Passei quase urna hora olhando a paisagem. "Na outra margem o mundo é outro", pensei. "Lá não existem os valores deste em que vivo." Lá começava um diferente, entre os dois, aquela água impedindo uma aproximação serena e normal. Confesso ter chorado um pouco. Chorei sim, e na verdade não foi um pouco, não. Foi muito. Caí em prantos. Até olhei em volta para ver se alguém estava por perto. Não sei bem por que chorei. Acho que fui surpreendida pela revelação de Ellen Marinalva quanto aos "motivos" que eu deixava transparecer a Felício. Como se ele e agora Ellen Marinalva conseguissem ler os meus pensamentos. Isso me afetou. Lembra em alguma coisa a história que me propus contar.

      Reli o que já escrevi até este capítulo e me dou conta de que, além de transformar a minha vida em ficção, tento interpretar o encontro dramático das civilizações na região amazônica, busco decifrar as razões do conflito entre índios e brancos, procuro adivinhar o perfume de manga madura para uns e o travo de banana verde emanado dos destroços para outros. Recorro novamente às lendas das numerosas nações indígenas ouvidas no internato, lidas em obras sobre a cultura das civilizações da floresta amazônica, vividas em sonhos na rede embalada com suavidade por minha mãe à sombra das goiabeiras. Esses mistérios da floresta que invadem o caderno de capa com desenho do mapa do Brasil me oferecem abrigo e sustentação. Só assim consigo ir tocando a minha história, a da minha mãe e a dos Nauás.

     A professora dá as suas aulas — hoje foi matemática e geometria, "revisão", como disse — sempre me olhando. Prometi a mim mesma que na próxima semana venho com outra roupa. Talvez seja urna reação ao seu jeito de olhar, o que me incomoda. Urna coisa não tem nada a ver com a outra, mas que vou usar outra roupa vou. Segundo os rapazes que, claro, notaram, estou me tornando um objeto de curiosidade. A conversa que o conhecido de Josimar ouvira teria mesmo fundamento. A professora diz a toda hora "não acha, Ana? Concorda, Ana?" Na saída, hoje, perguntou: "Como vai a sua novela, Ana?" O relato da minha mãe tinha se transformado em novela! Repliquei: "Não tão bem quanto o outro tipo de novela, o da televisão, mas vai indo."

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    Gostei da minha própria resposta. Acho que não manifestei nada que pudesse trair meus sentimentos pelo Felício. Nada. Nem palavras, nem gestos, nada. No entanto, até a Ellen Marinalva decifrou alguma coisa na minha reação, só pode ser. E o Felício traduziu além do que os olhos vêem e a palavra específica. Como nessa minha história, fiquei com uma baita de uma raiva. A margem do rio me trouxe alguma paz.

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