Profº Godofredo de Oliveira Neto
Ana e a margem do rio
Godofredo de Oliveira Neto
Capítulo 25
Do convento, fui, apressada, à casa de Josimar, depois à de Galdino. Deixei até agora Fabi de fora desta história, ela já tem os seus problemas. Quero falar com ela quando tiver a decisão tomada e argumentos para explicar a eventual viagem. Sei que ela não aprovará de jeito nenhum a minha partida. Não pára de dizer que sou a sua única amiga. Índia com cabelo pintado de louro nem sempre arranja amigo ou namorado, eu não canso de lhe explicar.
Josimar, como a irmã Gicélia, também não pestanejou. Expliquei tudo muito rápido. Disse-lhe que o seu amigo tinha razão quando ouvira alguma coisa sobre o meu trabalho escrito. Discretamente, ele deixou entender que vinha se encontrando com a Fabi. A danadinha não me disse nada. A resposta dele foi taxativa: "É claro que tem que ir, sua boba. Vê se arranja alguma coisa também pra gente. E, de qualquer maneira, você vai voltar mesmo um dia; é tudo provisório." Falei da minha pressa hoje, devia dar a resposta amanhã, tinha até esquecido a televisão ligada.
Dois a zero.
Já eram três horas da tarde. Fui à casa de Galdino; ele não estava. A vizinha, que eu conhecia, disse que ele tinha saído com uma moça loura. Respirei aliviada. Acabaram se encontrando, ufa, não foi necessário rezar para que namorassem. Encontrei-o na rua, de volta, sorridente, sem Ellen Marinalva. Conversamos ali mesmo, em pé. Ele só me disse "eu sabia, Ana, que você era diferente de nós. Um dia, a gente ia te perder, por isso eu disse aquelas coisas naquela vez no galpão da serraria, corno já te falei. Mas agora já passou. Você é nossa índia guerreira; uma amazona das boas". A conversa foi um pouco mais pesada do que com o Josimar. Galdino não falou nada da sua namorada. Mas foi extremamente afetuoso e gentil. A exemplo de Josimar, afirmou, peremptório: "Claro que você deve ir, vamos ficar aqui de longe torcendo. Sei que você não vai esquecer mesmo da gente! Todos nós gostamos muito da nossa Ana, muito mesmo." Enlaçou-me pela cintura e repetiu "muito mesmo".
Três a zero.
Expliquei que, caso viajasse, seria dentro de um mês. Teríamos tempo de conversar muito ainda. Na volta peguei um pequeno tronco caído perto da estrada. Escolhi um lugar bem exposto ao sol, ajeitei o tronco como mamãe fazia. Pensei nela com força, sabia que o sol do dia seguinte ia esquentar a madeira. Esquentar para sempre, como o calor da vida no corpo.
As conversas com os três — irmã Gicélia, Josimar e Galdino — foram bem mais densas e longas do que pode parecer neste meu capítulo. É que tenho pouco tempo para decidir. De qualquer maneira, voltarei a conversar com os três amanhã de manhã, como já prometi. O próximo que quis consultar foi, claro, o Felício. Não o encontrei em lugar algum. Tinha deixado Felício por último de propósito, me dava mais tempo pra pensar.